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Em um entardecer de Outono em Itaboraí: surgem as histórias...

26/07/2015

Gilciano Menezes Costa

Fonte: Acervo Pessoal (2015)

O local exposto na fotografia representa uma das principais regiões de Itaboraí, caracterizada por um intenso dinamismo cultural, social, político e religioso. Iniciado em finais do século XVII, esse dinamismo ganha maior dimensão no decorrer da primeira metade do século XIX.

Na parte esquerda da imagem, acima da chaminé [1], encontra-se a torre sineira da Igreja de São João Batista (1725-1742) juntamente com seu frontão, contendo um óculo em seu centro, dois coruchéus e um crucifixo. Em seu fundo aparece uma pequena parte da Serra do Barbosão [2].

Mais próximo ao centro da imagem, destaca-se a Igreja do Nosso Senhor do Bonfim (construída entre as duas últimas décadas do século XVIII), sobressaindo sua torre e um frontão triangular acima das três janelas centrais e com uma cruz de metal em cima.

Em frente a essa Igreja, ao lado esquerdo de um coqueiro, está localizado a Loja Maçônica Concórdia Segunda, construída em maio de 1833, aparecendo na fotografia os seus fundos, o telhado e a parte de trás do seu frontão triangular.

Subindo a rua lateral a Igreja do Bonfim, no mesmo lado da rua, é possível visualizar os fundos do Teatro João Caetano. O início da construção da estrutura atual desse teatro ocorreu, ainda que simbolicamente, no dia 22 de Maio de 1985. Vale destacar que outras duas estruturas do teatro João Caetano existiram nesse mesmo local, sendo uma delas demolida em 1976 [3].

Ao contrário do que parte da memória coletiva local acredita [4], o célebre ator e dramaturgo João Caetano dos Santos, embora tenha atuado nesse palco na década de 1850, não estreou sua carreira nesse teatro, mas sim em um pequeno teatro improvisado, em 1827, na “ladeira do Bonfim”, que segundo o historiador Sérgio Buarque de Holanda ficava localizado “em frente à Igreja do Senhor do Bonfim” [5].

A parte arborizada na imagem corresponde a praça que atualmente recebe o nome de Marechal Floriano Peixoto [6]. Essa praça, juntamente com mais 9 ruas que desembocavam nela [7], sendo uma delas visualizada na imagem, representou no século XIX, sobretudo em sua primeira metade, um expressivo espaço de projeção cultural e política da província do Rio de Janeiro, devido ao crescimento econômico que a Vila de São João Itaborahy alcançou por conta da produção de açúcar e de um rápido período de produção de café.

No decorrer do século XIX e em diferentes momentos, nomes de prestígio circularam por essa região, entre outros, destacam-se os Itaboraienses Salvador de Mendonça, Visconde de Itaboraí, Barão de Tapacorá, Barão de Itambi, os jornalistas Hermeto Luiz da Costa, juntamente com seu filho Hermeto Júnior, e Alberto Torres que, acompanhado de Silva Jardim, divulgava a campanha republicana nos anos próximos de sua proclamação [8]. Além desses, diferentes personagens da família real também visitaram o local [9]. Sem dúvidas no âmbito da cultura, o nome de destaque foi o de João Caetano dos Santos.

A população negra, de forma expressiva, também esteve presente nesse espaço, sejam como escravos, libertos ou livres. No Censo de 1872, foi apresentado um registro de 3 artistas escravos. Ainda que essa classificação de artista, nesse período, englobe variadas profissões liberais, como o trabalho em “industrias artesanais”, a arte do teatro já era considerada uma das principais existentes nessa classificação [10]. Embora ainda necessite de uma análise mais minuciosa, esse registro contribui para pensar nas diferentes formas em que o negro atuou na cultura da região.

Em Itaboraí, uma simples imagem de um entardecer de Outono pode revelar muitas histórias, basta querer enxergá-las...

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Fontes e Bibliografia:

Fotografia: Tirada por Gilciano Menezes Costa (2015) 

[1] Chaminé da Cerâmica São João Batista de J. Lourenço & irmão, LTDA, Matriz. Seus proprietários João Lourenço da Silva e José Lourenço da Silva foram, entre outros, os principais industriais de cerâmica em Itaboraí. Até 1983 chegaram a ser donos de 6 cerâmicas na região, são elas: S. João Batista, Iguá, Ipitanga, Carioca, Veneza e Santo Expedito. Jornal O São Gonçalo, 22 de Maio de 1983. Acervo: Heitor Costa.
[2] Uma das áreas de maiores altitudes do município, onde ainda existe os resquícios da Mata Atlântica na região. Localizada na parte Leste do Município, na divisa com o município de Tanguá, a Serra do Barbosão apresenta algumas nascentes de rios que desemboca na bacia do rio Caceribú. Para saber mais ver: Cadernos Itadados. Secretaria Municipal de Planejamento e Coordenação. PMI, 2006. P. 25-31.
[3] Jornal O Itaborahyense. Nº 2696, 22 de Maio de 1985; Nº 2697, 1 de Junho de 1985.
[4] Esse erro é difundido, principalmente, pelas obras produzidas pelo Poder Público Local, como pode ser visualizado no site da própria prefeitura:http://www.itaborai.rj.gov.br/nossa_cidade/predios-historicos/
[5] HOLLANDA, Sérgio Buarque de. João Caetano em Itaboraí. Como um meio enriquecido pelo café suscitou a primeira tentativa de criação de um teatro nacional. O café no 2º Centenário de sua Introdução no Brasil. Rio de Janeiro: Edição do Departamento Nacional do Café, 1934.
[6] Essa denominação foi dada a Praça, no início da Primeira República, como uma homenagem ao Marechal Floriano Peixoto. Esse militar também era conhecido como Marechal de Ferro pela maneira feroz com que reprimiu todos os focos de oposição a seu governo. Alguns moradores, incluindo o autor do texto, defendem a substituição da atual denominação da praça, propondo nomes de Itaboraienses como Joaquim Manuel de Macedo e Hermeto Luiz da Costa.
[7] Ver o mapa do Major Rivierre de 1838. COSTA, Gilciano Menezes. A escravidão em Itaboraí: uma vivência às margens do rio Macacu (1833-1875). Dissertação de Mestrado. Universidade Federal Fluminense, Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Departamento de História, 2013. p. 137.
[8] Gazeta da Tarde. 11 de Agosto de 1888.
[9] Jornal O Itaborahyense. N º 2557, 22 de Maio de 1982.
[10] SOARES, Luiz Carlos. O “povo de Cam” na Capital do Brasil: A escravidão urbana no Rio de Janeiro do século XIX. Rio de Janeiro: Faperj - 7 letras, 2007. p. 158.

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Gilciano Menezes Costa é Doutorando em História Social da Cultura na UFF. Professor de História e Filosofia na Rede Estadual em Itaboraí e Professor de História na Rede municipal de Magé. É autor da Dissertação de Mestrado (UFF) intitulada "A escravidão em Itaboraí: Uma vivência às margens do Rio Macacu (1833-1875)". Disponível em:
https://docs.wixstatic.com/ugd/5ada89_277b353622e44d018f55ecdb12aa561a.pdf

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